A queda de Barcelona e a abolição da Generalitat (1714-1716)

O que representou o Decreto da Nova Planta para a Catalunha?

Em março de 1713 as tropas de Felipe V iniciavam o cerco à cidade de Barcelona. A Catalunha, reduzida a duas áreas fortificadas: Barcelona e Cardona, teria de optar em render-se ou continuar a luta em defesa própria. Em meados de 1713 foram convocados os “Braços Generals” (as Cortes sem o rei) para tomar uma decisão.

Os braços militar-eclesiástico e os deputados da Generalitat, diante da desproporção entre as forças catalãs (desfalcadas já das tropas de apoio da Grande Aliança) diante das de Felipe V, inclinavam-se pelo rei Borbon. Entretanto, o braço popular decidiu votar a favor da resistência. Em vista dessa decisão, a Generalitat uma vez mais, fez um chamamento público para a defesa da cidade.

O cerco foi iniciado pelo duque de Berwick, general francês, imposto por Luis XIV ao seu neto, Felipe V. O general Antoni de Villaroel foi colocado à frente das tropas catalãs. A Catalunha via em Felipe V a instauração definitiva do absolutismo e do centralismo em todos os territórios conquistados. O cerco a Barcelona é visto por testemunhos contemporâneos como a agressão a um povo que havia feito da liberdade o fundamento das suas instituições. Escritores da época descrevem a defesa de Barcelona como um gesto heroico admirado em toda a Europa. Dezoito meses de cerco e de lutas ferrenhas obrigaram a capitular em 11 de setembro de 1714: os defensores mais destacados de Barcelona, Rafael Casanova, conselheiro chefe do Consistório da cidade, e o general Antoni de Villaroel, comandante supremo das forças militares, quiseram poupar uma derrota completa da cidade e dos seus defensores.

Em 15 de setembro de 1714, o Duque de Berwick assinou a nomeação da “Real Junta Superior de Justicia y Gobierno”, que sob a presidência do conselheiro filipista José Patiño, substituía a autoridade da Generalitat e do “Consell de Cent”. No dia seguinte, José Patiño lia, diante do presidente da Generalitat, o decreto de dissolução: “Habiendo cesado por la entrada de las armas del Rey N. S. (Q. D.G.) en esta Ciudad y plaza la representación de la Diputación y Generalidad de Cataluña, el Excmo. Sr. Mariscal Duque de Berwick y Liria, me ha encargado qua ordene y mande a los diputados y oidores de cuentas del General de Cataluña, que arrimen todas las insignias, cesen totalmente, así ellos como sus subalternos, en el ejercicio de sus cargos, empleos y oficios y entreguen las llaves, libros y todo lo demás concerniente a dicha casa de la Diputación y sus dependencias…” .Valencia e Aragão, já haviam caído em mãos da coroa castelhana. Mallorca e Eivissa seriam tomadas no ano seguinte. Pelo Tratado de Utrech (1713) Menorca foi cedida a Inglaterra, e os outros territórios da antiga coroa de Catalunha-Aragão ficaram desmembrados: Nápoles e a Sardenha passavam a submeter-se à soberania Austríaca, e a Sicília foi entregue ao Duque de Savoia.

Abolidas que foram a “Generalitat” e o “Consell de Cent”, desarmadas e extintas as forças militares catalãs, exilados, aprisionados ou condenados a morte os líderes da resistência, demolidos seus castelos, fechada a Casa da Moeda, suprimida a Universidade de Barcelona e os “Estudis Generals del Principat”, decretado o uso oficial do castelhano ao invés do catalão, a Catalunha perdia todo o poder político e era submetida a um longo processo de castelhanização.

O novo regime da Catalunha, instaurado provisoriamente em 1714, foi definitivamente estruturado pelo Real Decreto de Nova Planta em 16 de janeiro de 1716, submetido à aprovação do Conselho de Castilha. O Decreto de Nova Planta confiou o poder máximo de governo a um militar: o Capitão General, assessorado pela “Real Audiência”. A divisão territorial do Principado em “vegueries”, já mencionada no tempo de Jaume I e formalmente estabelecida em dezoito “vegueries” desde 1304, foi substituída por uma divisão em doze corre-gimentos e um distrito (Vall d’Aran). Contudo, nem as antigas “vegueries” nem os corregimentos, nem as futuras províncias refletiam as realidades humanas e geográficas da terra. Seria necessário esperar mais de dois séculos para que a organização territorial em comarcas fosse recuperada pela nova Generalitat do século XX.

Durante o reinado dos sucessores de Felipe V, Fernando VI (1746-1759) e Carlos III (1759-1788) a atenção dos catalães voltou-se para o ressurgimento cultural e econômico, favorecido pela concessão de Carlos III aos portos catalães de comercializar diretamente com a América, antes proibida. É o momento do desenvolvimento industrial da Catalunha.

A vida política, porém, está centrada na Corte de Madrid, de onde emana tudo o que afeta o governo da Catalunha. Se Felipe V havia eliminado o uso oficial do catalão, Carlos III, por uma “Real cédula” de 1768, o elimina do ensino primário e secundário. Estas medidas não resultaram evidentemente no total desaparecimento da língua catalã, que foi, aliás, veiculo de notáveis criações literárias. Catalunha, a pesar da submissão oficial à nova monarquia, não tinha perdido totalmente sua consciência nacional. Quando em 1789 se reúnem as Cortes em Madrid para o juramento do príncipe Fernando, a representação catalã apresentou-se como a “Deputação do Principado de Catalunha”, reminiscência da abolida “Generalitat”.

A Revolução Francesa atuou em certos setores da Catalunha como um golpe de vento com ares de liberdade. No momento em que a França declarou guerra à Espanha (1793) dando lugar à denominada “Guerra Grande”, a Catalunha organizou a sua defesa conta os franceses, que resultaram perdedores. Em 1795 firmava-se a paz de Basilea com a restituição recíproca dos territórios ocupados.

O aparecimento de Napoleão Bonaparte e o envio de seu exército para a conquista da Europa envolveram novamente a Catalunha em nova guerra de defesa, apenas treze anos após finalizada a “Guerra Grande”. Carlos IV (1788-1808) foi incapaz de enfrentar a situação e Napoleão aproveitou-se habilmente da debilidade do rei e da inexperiência de Fernando VII para ampliar seu império. A defesa do território catalão era movida, naquele momento, pela revolta contra o invasor e por sentimentos religiosos. Em meados de 1808 constituiu-se a “Junta Superior del Principat”, a qual organizou, de forma autônoma, as forças militares da defesa. Iniciou-se assim um período de guerra desoladora que deixou o país devastado e na miséria. Napoleão tentou ganhar a simpatia de Catalunha oferecendo uma forma de autogoverno independente da coroa de José Bonaparte (1810) e decretando o catalão como língua oficial.

A junta superior do “Principat”, que havia atuado como governo num momento de emergência, foi abolida e substituída por um organismo estabelecido na Constituição de Cádiz: a deputação provincial, presidida pelo capitão-general, autoridade máxima no “Principat” já que a guerra contra a ocupação francesa havia levado a um predomínio dos militares. Conforme a Constituição de Cádiz (1812), Catalunha foi dividida em províncias.

Com o absolutismo de Fernando VII, que em 1813 havia recuperado de Napoleão a coroa da Espanha, voltou-se ao regime de “corregimentos”, até que no ano de 1833, implantou-se novamente a divisão por províncias. No transcurso do século XIX, a Catalunha viu-se submetida a lutas civis, às guerras carlinas e aos confrontos entre partidos. A efêmera Primeira República espanhola de 1873 teve como primeiros presidentes dois catalães: Figueras e Pi i Maragall. Um golpe militar derrubou a República e restaurou a monarquia com Afonso XII (1874), sucedido por Afonso XIII sob a regência prévia de Maria Cristina (1885).